A estreia da minissérie “Senna” na Netflix prometia acelerar corações. Com um orçamento monumental de R$ 250 milhões, gravações em quatro países e mais de 300 diárias de filmagem, o projeto já nasceu com status de superprodução, sendo o maior investimento da plataforma no Brasil nos últimos anos.
A direção ficou nas mãos competentes de Vicente Amorim e Julia Rezende, que entregam uma obra tecnicamente impecável, especialmente nas cenas de corrida. Entre recriações, imagens de arquivo e efeitos visuais, o espectador quase sente o cheiro de gasolina.
Mas, se no asfalto a minissérie acelera, no roteiro ela derrapa.
O primeiro ponto crítico é o tom claramente chapa-branca. Como a produção teve o aval da família de Ayrton Senna, o piloto é apresentado como um herói imaculado, incapaz de qualquer deslize moral. Até decisões controversas, como a mudança abrupta de equipe, são suavemente justificadas ou, pior, varridas para debaixo do tapete narrativo. A construção do personagem principal é tão limpa que perde a humanidade.
O segundo problema é o didatismo exaustivo. O roteiro, temendo que o público se perca nas curvas da história, entrega diálogos que mais parecem instruções técnicas. A personagem Laura, uma jornalista fictícia, assume o papel de explicadora oficial. Sempre que uma decisão estratégica ou uma punição precisa ser compreendida, lá está ela, detalhando tudo nos mínimos detalhes, transformando o drama em algo previsível e cansativo.
E não para por aí. Os antagonistas, como Jean-Marie Balestre, são caricaturas de vilões, quase saídos de um desenho animado. Fumam charutos, tramam em salas escuras e parecem motivados apenas pelo desejo de prejudicar o “herói brasileiro”. Não há nuances, apenas um maniqueísmo cansativo.
O resultado? Uma obra que, apesar do luxo e da grandiosidade, resvala na superficialidade. Os personagens são arquétipos previsíveis, os diálogos parecem retirados de uma novela das oito, e o espectador mais atento adivinha cada virada dramática.
No fim, “Senna” é uma oportunidade perdida. A vida do piloto, com sua glória e tragédia, merecia mais profundidade e menos envernizamento. O público queria emoção crua e encontrou uma história embalada a vácuo.
Uma pena. Afinal, Ayrton Senna sempre correu no limite. A minissérie, no entanto, preferiu a zona de conforto.