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Editorial: O bolsonarismo sob pressão

Por ora, o que resta é um país assistindo a um ex-presidente lutar contra as grades que ele mesmo ajudou a forjar — e uma direita que, refém de seu próprio mito, ainda não sabe se quer libertá-lo... ou se libertar dele.

Por: Carlos Leen
26/03/2025 às 15h15 Atualizada em 31/03/2025 às 18h47
Editorial: O bolsonarismo sob pressão
Bolsonaro faz pronunciamento no Senado após STF torná-lo réu - Pedro Ladeira/Folhapress

Na tarde desta quarta-feira (26), a Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) aceitou a denúncia da PGR contra Jair Bolsonaro e sete aliados, acusados de integrarem o núcleo duro da tentativa golpe em 2022.

Aceitou também, simbolicamente, a responsabilidade de escrever um capítulo turbulento da política brasileira.

A decisão unânime, que transforma o ex-presidente em réu, ecoa um terremoto que desafia um bolsonarismo que oscila entre a resistência e a implosão.

O Peso dos Dias

Os últimos dias foram uma sucessão de derrotas para o campo bolsonarista. A condenação da deputada Carla Zambelli (PL-SP), foi consolidada por maioria no STF.

Já o protesto no Rio de Janeiro, que reuniu menos adeptos do que o esperado para pedir “anistia a golpistas”, mostrou que a base militante, antes inflamada, hoje parece dividida entre a exaustão e a descrença.

Enquanto isso, Bolsonaro, inelegível até 2030, assiste ao próprio mito se transformar em um dilema: como ser ao mesmo tempo mártir e fardo?

O Paradoxo do Rei sem Coroa

Há uma ironia cruel na teia que envolve a direita brasileira.

Bolsonaro, hoje, é visto por aliados como um “âncora” eleitoral — figura tóxica para o eleitorado moderado, mas ainda detentor de um poder de veto sobre qualquer nome que ouse sonhar com o Planalto.

“Sem o aval dele, não se vence uma prévia sequer”, admite um deputado do PL.

O ex-presidente, porém, está enredado em processos que podem levá-lo à prisão, com provas robustas sobre sua participação em atos golpistas.

Se condenado, sua imagem oscilará entre a de “herói perseguido” e a de “lastro do passado”.

Eduardo Bolsonaro, autoexilado nos EUA, tornou-se um enigma. Oficialmente, ele nega fugir da lei, mas seu sumiço do Brasil alimenta teorias.

Há quem veja em sua estadia nos Estados Unidos uma tentativa de criar uma “frente internacional” contra o governo Lula, buscando apoio de grupos extremimistas globais para deslegitimar as instituições nacionais.

Paralelamente, as postagens agressivas e desastradas nas redes sociais de Jair Bolsonaro — “tão ruins que parecem escritas por ele mesmo”, brinca um analista — são ao mesmo tempo combustível para a base radical e material para processos futuros.

A Aposta na Martirização

Nos bastidores, setores do bolsonarismo começam a calcular friamente.

Para alguns, uma eventual prisão de Bolsonaro não seria uma tragédia, mas uma oportunidade. “Ele seria o Lula de 2018”, especula um estrategista.

O risco, porém, é que o bolsonarismo, sem seu líder livre para comandar palanques, se fragmente em caciques regionais — ou se reduza a um movimento saudosista, sem projeto além da nostalgia.

A Corrida contra o Relógio

Enquanto o processo avança, aliados se dividem: parte defende antecipar a escolha de um nome para 2026, apostando em figuras como Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) ou até mesmo em Michelle Bolsonaro.

Outros insistem em esperar, temendo que qualquer movimento precoce seja lido como traição.

Com ou sem Bolsonaro o campo conservador se assemelha a um quebra-cabeça sem peça mestra — e o tempo, para eles, não é um aliado.

Por ora, o que resta é um país assistindo a um ex-presidente lutar contra as grades que ele mesmo ajudou a forjar — e uma direita que, refém de seu próprio mito, ainda não sabe se quer libertá-lo... ou se libertar dele.

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