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Editorial: O Contraste entre os números e a popularidade

O PIB cresce, o pão encarece: Quando a Economia é só número e o governo é só Desencanto

Por: Carlos Leen
18/02/2025 às 16h34
Editorial: O Contraste entre os números e a popularidade
Enquanto o PIB dança um samba de 3% ao ano, o preço do pão faz um pagode de 15%. Enquanto a indústria renasce como Fênix das cinzas neoliberais, o café vira artigo de luxo nas periferias.

O governo Lula III vive um paradoxo digno de García Márquez: a economia e o PIB vão bem, e a aprovação vai mal. E no Brasil, como ensinou a finada Maria da Conceição Tavares, ninguém come PIB.

Os números são bonitos — desemprego caindo, inflação domada, Amazônia respirando —, mas o prato do dia continua indigesto.

O povão não liga se o mercado financeiro está eufórico; liga se o mercado municipal está um assalto. Enquanto temos “taxa de investimento recorde”, Dona Maria, da Vila Vintém, exibe a conta do botijão de gás: R$ 120.

E adivinhe qual slide ganha a eleição?

A ciência política brasileira tem uma lei não escrita: o eleitor vota com o estômago. Brizola sabia disso. Em 1982, quando o sorteio dos temas de debate o condenou a falar de agricultura — assunto que ele detestava —, o velho Leonel jogou a cartada do leite mágico.

Prometeu uma vaquinha em cada esquina do RJ.

Não explicou planilhas, não citou PIB per capita. Falou em leite grátis para as crianças, e o povo, sedento de utopia, deu-lhe o governo. 

Lula 3.0, porém, parece ter esquecido o manual.

Enquanto a direita abraça a guerra cultural com a fúria de um pastor neopentecostal, o Planalto navega em águas mornas: faz concessões ao mercado, bajula generais, e acha que governabilidade se compra com meias medidas.

O resultado? Uma base aliada que parece torcer contra, uma oposição que ri à boca cheia, e um eleitorado que olha para Brasília e pensa: “Cadê o projeto? Cadê o sonho?”.

Não adianta reduzir o desmatamento se o povão não vê a cor da melhora.

Não basta a indústria crescer se o salário mínimo engatinha. E não há macroeconomia que sobreviva ao microcosmo da feira livre, onde o tomate é inimigo número 1 e o quilo do arroz virou personagem de novela das 9.

O risco é claro: sem narrativa de esperança, o PT vira piada pronta para o próximo Bolsonaro — ou pior, para um Tarcísio com MBA e sorriso de rede social.

Enquanto isso, a direita não dorme. Aprendeu com Trump, com o MBL: prometer o impossível vende mais que realizar o possível. E o povão, cansado de migalhas, pode acabar comprando o conto do “faço você rico em 3 meses”, mesmo que o vendedor seja um charlatão de terno Armani.

Lula, o artesão das utopias, parece ter trocado o discurso de “mudar o Brasil” por um PowerPoint de “equilibrar as contas”. Mas o Brasil não quer equilíbrio; quer Paulo Freire e JK numa mesma frase.

Quer um projeto que una Amazônia preservada, trem-bala e feijoada acessível.

Quer, no fundo, acreditar que o futuro não é só uma repetição do passado com inflação mais baixa.

O grande erro do atual governo é não enfrentar a guerra cultural e não apresentar uma visão inspiradora para o país. Fazer concessões ao mercado, à direita e aos militares pode garantir a governabilidade, mas não gera entusiasmo popular.

Afinal de contas, como diria Eduardo Galeano, a utopia nos serve para continuar andando. Em frente.

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